O Banco Central do Brasil acertou em cheio com o Pix, inovação bancária digna de ser copiada por qualquer BC do mundo. Mas ainda acho o Pix bem burocrático de ser usado. Vejo que ele é um sucesso porque era algo muitíssimo desejado, não por ter boa usabilidade nem por promover boas práticas. Minha veia de designer de aplicações não pode deixar de sugerir algumas melhorias que poderiam ser feitas numa próxima revisão, especialmente em relação a usabilidade.
- Em primeiro lugar, ficar usando e divulgando CPF e celular como endereço bancário fere de mais a privacidade das pessoas. Há o endereço aleatório, que é um indigesto UDID, mas seu uso é pouco incentivado. Telefone como endereço Pix deveria ser usado só entre amigos que já têm o número um do outro. E CPF então, nem se fala… Eu nem tenho coragem de citar aqui e agora as coisas que poderia descobrir sobre você tendo só o seu CPF. Este parágrafo fica como dica para você, usuário do Pix — use chave aleatória sempre que puder.
- Outro aspecto pouco prático é que a pessoa que divulga um endereço Pix precisa informar se aquilo é um CPF ou celular, pois há CPFs que se parecem com número de telefone e vice-versa. E o pagador precisa dizer ao banco que tipo de chave é essa (CPF, telefone), não é detectado automaticamente.
- Mais um aspecto triste é o Pix-copia-e-cola ser sub-utilizado. Para quem não sabe — e muitos não sabem —, o Pix-copia-e-cola é um código comprido que tem tudo: endereço do credor, valor, mensagem. Se preciso cobrar alguém, eu gero um Pix-copia-e-cola e passo para a pessoa. Acontece que quase ninguém sabe o que fazer com esse código e como usá-lo para efetivamente executar o pagamento. O pagador primeiro precisa saber do que se trata, navegar pelos menus do aplicativo bancário e colá-lo no lugar certo. Este é um exemplo de Pix-copia-e-cola válido que você pode usar para me pagar R$10:
00020126890014BR.GOV.BCB.PIX01364cf0670d-87f9-4056-b48b-cbe57aa29ba40227Exemplo de Pix-copia-e-cola520400005303986540510.005802BR5914AVIRAM ALKALAY6009SAO PAULO622605222X9lnULfWGEqFhJGgrYWXC63046086
Eis uma sugestão de solução para todos esses problemas
Bastaria o endereço Pix ser uma URL, visto que URLs já representam o endereço de praticamente tudo no universo digital. Segue uma sugestão de solução hipotética.
- Endereço Pix que é um telefone:
pix://11912344321.tel
- Endereço Pix que é um CPF:
pix://78912365422.cpf
- Endereço Pix que é uma chave aleatória:
pix://abc-xyz-kyw.alt
- URL de um Pix-copia-e-cola que contém credor (endereço aleatório), valor (R$10) e mensagem (“olá mundo”):
pix://abc-xyz-kyw.alt/?val=10.00&msg=olá%20mundo
- O código QR da última URL:
- Menos conhecido ainda, um Pix pode ser feito diretamente para uma conta bancária, sem CPF nem telefone nem endereço aleatório, igual um TED. Nesse caso a URL ficaria assim:
pix://{{instituição, agência e conta bancária codificadas}}.cc/?val=10.00&msg=olá%20mundo
Os parâmetros para valor ou mensagem, ou ambos, poderiam ser omitidos para deixar o pagador preenchê-los, opcionalmente.
No mundo físico, essas URLs seriam divulgadas como códigos QR impressos. E sendo um QR/URL válido, a câmera que o captura, ou o simples ato de clicar no link, abriria o tratador correto, que provavelmente seria o aplicativo do seu banco, mas não precisaria pedir para o pagador escrever mais nada, só pediria confirmação para a transação cujos dados e parâmetros estariam todos já resolvidos e no lugar certo.
Com exatos 2 toques de tela (passos 1️⃣ e 3️⃣) e mais a inevitável autenticação no aplicativo bancário (passo 2️⃣), o pagamento seria realizado.
Do jeito que é hoje:
- Não existe link de Pix para se clicar
- Códigos QR só são legíveis com a câmera da app bancária; um leitor qualquer de códigos QR não consegue disparar o aplicativo bancário
- Caso o pagador inicie o processo com um endereço textual, terá que manualmente copiar e colar o texto pois números de telefone e de CPF não viram links automaticamente. E entre os passos 2 e 3 do diagrama de jornada acima ainda tem que manualmente selecionar e preencher diversas outras informações